Os 100 corvos faladores

Umha mulher vivia soa na Chaira da Chuva.

Por Séchu Sende | Vigo | 25/05/2011

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Umha mulher vivia soa na Chaira da Névoa com 100 corvos faladores.

Criara 100 corvos umha mulher e aos 100 corvos cortara-lhes o músculo do siléncio, que está por baixo da língua, e os corvos aprenderam a dizer palavras.

A mulher vivia com 100 corvos no seu labradio. E os corvos viviam com ela. Nom vivia com 100 gatos nem com 100 cans nem com 100 vacas, nom: vivia com 100 corvos, 100 corvos faladores.

Falava a mulher com os 100 corvos na Chaira que Vai Cambiando de Nome.
100 corvos negros pousados na neve da Chaira dos 100 Corvos Faladores no inverno.
100 corvos negros a voarem no reflexo das poças da Chaira das Ras em primavera.

Adestrou 100 corvos aquela mulher na Chaira Cha e aprendeu-lhes a falar. A cada corvo, as suas palavras.

Caminhava pola Chaira dos Mil Rios aquela mulher com 100 corvos a voar á sua beira.
E os corvos faladores da mulher falavam e o vento levava e traía as palavras dos corvos no ar.

Caminhava cara á cidade, a mulher, de vez em quando, com um vestido vermelho de cotio, e 100 corvos faladores sobre dela no céu.

-Aí chegam os 100 corvos faladores, berravam os nenos.
-Vem com eles a mulher, a mulher vem com eles, a mulher de vermelho! anunciavam as nenas.
-Rápido, que as palavras venhem a favor do vento e chegam antes!, diziam os velhos.
-Tapai os ouvidos, avisavam as velhas, para nom ouvir as verdades.
-As verdades, as verdades!, corria espaventado um senhor de gris pola rua do méio.
-Nom creades as verdades, som mentira!, berrava umha senhora de chapeu negro com as maos nas orelhas.

E a mulher de vermelho cruzava lentamente a cidade, lentamente através, lentamente, e os corvos faladores falavam. Alguns falavam pousados nos telhados, nos ciprestes da alameda, na fonte da praça, na torre da igreja, no relógio do concelho, ou voavam a dizer as verdades no ar. Ás vezes os corvos reuniam-se todos juntos na praça.

E todo o mundo sabia.

Que os corvos ceivavam as verdades. Os granhidos eram palavras. As palavras caiam do céu. E muita gente, aínda que fazia que nom, ponhia o ouvido para as recolher.

Dava a impresiom de que havia gente que tinha medo do que podia escoitar. Alguns fechavam-se na casa. Outros cantavam em alto para nom ouvir outra cousa que a si mesmos.

A gente sabia que se escoitavam aquelas verdades a sua vida podia cambiar. Já tinha sucedido. Desde que os 100 corvos faladores começaram a vir á cidade, algumhas cousas mudaram dum dia para outro sem explicaçom... Umha mulher espetara-lhe ao xastre umhas tesouras na mao direita, por exemplo.

E havia ruas que cambiavam de nome, caminhos que mudavam de lugar, gente que cambiava de língua. Um velho mudou de passado e umha nena, de futuro. E havia cousas que nunca cambiavam que tamém cambiarom.

E quando os corvos cansavam de falar, a mulher e os 100 corvos voadores regressavam á Chaira Sem Nome.

-Isto nom se pode permitir, berrou um dia um velho.
-Essa mulher é perigosa!, dixo alguém,
-Umha tola!, cuspiu umha mulher.
-Umha bruxa!, berrou outra.
-Só nos trae desgraças!, dixo um home de gravata.
-Há que acabar com os 100 corvos faladores, dixo outro, de traje gris.
-Os jornais dim que está tola, dixo umha mulher erguendo um periódico de letras vermelhas.

Daquela dixo umha nena: Mas, se acabades com os 100 corvos faladores quem nos vai dizer as verdades?

Quem vai dizer as verdades se acabades com os 100 corvos faladores?, perguntou.

Dizem que de vez em quando aparece polo caminho que vem da Chaira dos 100 Corvos Faladores umha mulher com 100 corvos faladores.

E que ás vezes pousam nos telhados ou gralham nas praças.

Tamém dizem que se chegas a escoitar as palavras que ceivam os 100 corvos faladores e olhas os seus olhos já nunca volver ser a mesma persoa que eras antes, nunca mais.

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Séchu Sende Séchu Sende, professor de língua e literatura, escritor e domador de pulgas no Galiza Pulgas Circus, a sua última obra é Animais, Editorial Através, 2010. O seu livro de relatos Made in Galiza recibiu o prémio Anxel Casal ao melhor livro do ano 2007 e foi considerado o melhor publicado em língua kurda em 2010.