O meu filho deixou de falar galego

Suponho que resulta familiar ouvirmos esta frase -especialmente em ambientes urbanos- a famílias decepcionadas poucas semanas depois de a sua filha ou filho começar a ir à escola, pois, o mínimo a que deveríamos aspirar é às crianças poderem falar na língua transmitida por pais e mães. Contudo, desde que começou a caminhada autonómica há quase quarenta anos continuamos a estar no mesmo cenário, e a pergunta continua a ser a mesma: que se pode fazer?

Por Eliseu Mera | Ourense | 10/03/2021

Comparte esta noticia
A resposta que mais costumamos ouvir consiste em culpar o sistema de ensino, alegando que deveríamos ir a um desenho com o galego como língua veicular exclusiva, assim todo o alunado teria esta língua como referência para falar de qualquer assunto e repercutiria nos seus hábitos quotidianos. Resolveria-se assim o problema?
 
As pessoas que trabalhamos em centros de ensino vemos que a causa do problema de uma criança abandonar o galego ao entrar na escola está mais na língua falada polas suas companheiras e companheiros do que na língua veicular do ensino. De facto, em ambientes galego-falantes resulta pouco significativo que o ensino seja maioritariamente em castelhano, pois fora das aulas o alunado continua a falar em galego. Igualmente, numa contorna de ausência de falantes de galego, mesmo que se produzisse uma presença total do galego nas aulas -circunstância pouco verossímil a curto e a médio prazo- dificilmente mudaria a língua dominante no pátio e na rua. 
 
Se detetamos que o problema se localiza ao se relacionarem as crianças só resta uma hipótese: criarmos linhas opcionais de ensino em galego. Assim, as famílias preocupadas por transmitirem a língua agrupariam as suas filhas e os seus filhos e poderiam manter a língua materna no pátio e na rua ao sentirem companhia. Isto é o que fazem as Escolas Semente com grande sucesso, pois permite que se mantenham falantes que, noutra circunstância, desapareceriam.
 
Fica claro que no sistema atual as crianças castelhano-falantes permanecem como tais e as galego-falantes deixam de sê-lo. É isto o que queremos que continue a acontecer?
Agora viriam outro tipo de dúvidas. E se só uma parte pequena das famílias opta por esta via? 
 
Se poucas famílias optarem por esta via, as poucas que forem, teriam uma possibilidade real de transmitirem a língua, o qual não está a acontecer agora.
 
Renunciamos a que o conjunto da sociedade assuma o galego como língua própria? Fica claro que o simples aumento do número de horas de matérias em galego ajudou escassamente a melhorar o conceito a respeito da nossa língua das pessoas instaladas no castelhano, e mesmo em muitas galego-falantes.
 
Isto significaria criarmos uma espécie de ghetto? Em absoluto, pois rapazes e raparigas continuam a se relacionar com outrem procedentes de diversos centros de ensino em atividades extra-escolares e mesmo dentro da própria família. Criaria-se um grupo de apoio para perceberem que falar galego é uma cousa mais comum do que pensam em pessoas da sua idade. É acaso melhor o cenário atual que leva as crianças a trocarem de língua por vergonha?
 
Como podemos, portanto, motivar as famílias para optarem por este caminho? Mostrando a realidade, que o galego é útil. Para isso, na matéria Língua Galega e Literatura de todos os níveis de ensino, junto com as normas ortográficas ILG-RAG (coloquialmente conhecidas como “galego normativo”) introduzirmos a aprendizagem do português. Deste jeito, qualquer moça ou moço galego teria um domínio total das duas línguas românicas mais faladas do mundo: galego/português e castelhano/espanhol. 
 
Uma cousa que verificamos durante estes anos foi que forçar por lei o aumento de número de horas em galego pouco ajudou para manter a sua presença social. Também vimos que qualquer mudança legal que quiser permanecer no tempo deve ser fruto do consenso, em vez de maiorias parlamentares pontuais. Temos o precedente da Lei de aproveitamento dos vínculos com a lusofonia, mais conhecida como Lei Paz Andrade, aprovada por unanimidade em 2015. Esta via merece a oportunidade de ser explorada pois, se continuamos a fazer o mesmo, imos ter os mesmos resultados.

Neno xoga nun centro educativo.. XUNTA
Neno xoga nun centro educativo.. XUNTA
Comparte esta noticia
¿Gústache esta noticia?
Colabora para que sexan moitas máis activando GCplus
Que é GC plus? Achegas    icona Paypal icona VISA
¿Gústache esta noticia?
Colabora para que sexan moitas máis activando GCplus
Que é GC plus? Achegas    icona Paypal icona VISA
Eliseu Mera Eliseu Mera (Ourense, 1976). Cantor lírico e professor de Música do IES de Valga, Vice-presidente da AGAL e promotor da Semente Amaía. Acredito firmemente em que a boa música deve ser acessível para todos os públicos, sem exceção. Para este fim, experimento com um blogue: notas.gal.