Artigos de Joam Evans Pim

O martírio da memoria

Na passada semana, os três sindicatos agrários com maior presença (ASAJA, ligado ao PP; UPA, ligado ao PSOE; e SLG) anunciaram uma greve indefinida na produção leiteira que prometia levar até as últimas consequências a denúncia do espólio e sequestro ao que estão submetidos os produtores familiares e cooperativos. Mesmo contando com o compromisso do setor gandeiro, os sindicatos paralisaram a greve em apenas 48 horas, uma decisão que muitos consideraram um signo de debilidade que comprometia a posição lavrega frente às complicadas negociações ainda em curso. Também é certo que os mais de 10 milhões de litros de leite jogados fora representam uma sangria para a já fragilizada economia gandeira. Os sindicatos agrários pedem essencialmente mais intervenção estatal: que o governo garanta preços, que se crie um grupo lácteo por impulso autonómico e que se estabeleça um fundo de resgate para um setor que sofre um endividamento endémico que só pode tender a aumentar no atual quadro produtivo.

Mancomunidade ou democracia sem estado

Há quem gosto imenso de ver bandeiras islandesas na rua quando há manifestações. Não apenas pola valente atitude que o simpático povo dessa ilha atlântica tem demonstrado durante os últimos anos, mas pola velha e esquecida relação que tem com a Galiza. A Islândia comemora também, um milénio depois, os três séculos de existência da Mancomunidade Islandesa (930-1262), referente para um modelo político de democracia sem estado, fundamentado no consenso e na participação direta. Outros povos, desde a Galiza ao Curdistão, inspiraram-se nessa noção de confederalismo democrático, sustento de um povo livre.

Votantes anónimos

“Olá. Chamo-me Joám, tenho 28 anos e este domingo votei por vez primeira”. Assim poderia começar uma sessão de terapia de grupo entre os milhares de pessoas que vimos de participar, por vez primeira ou não, nas eleições de 21 de outubro, sabendo, no fundo, a farsa que representa o espetáculo eleitoral. Na sessão de “Votantes Anónimos” há todo tipo de histórias de vida que formam parte da particular “análise eleitoral” de cada quem.

A dura estória dum voto útil

Agora que se achega o dia das eleições ao Parlamento da Galiza, vão-se incrementando proporcionalmente os apelos ao voto útil dos eleitores por parte de todos os partidos: uns para procurar agrupar o voto neles, outros para fazer crer que eles são a chave da alternância e que é por isso é que são os que devem receber a confiança popular.

Paróquias e desprofissionalização política

Repetir tantas vezes a mesma cousa já cansa. Bem sei. Minhas desculpas. Mas estamos a poucas semanas da previsível aprovação no Congresso da lei que suprimirá a capacidade da Galiza de dotar de personalidade jurídica as suas paróquias. E é frustrante. Seria ingénuo pensar que PP ou PSOE iriam defender esta instituição, pois já em 1991 chumbaram no Parlamento galego uma primeira e cativa Lei de Paróquias da Galiza (decalco da aprovada anos antes nas Astúrias). Pouco se poderia aguardar também do BNG, que há poucos anos, na sua proposta de “Estatuto de Nação”, teve a bem eliminar qualquer referência à personalidade jurídica da paróquia. Porém, nem tudo é grisalho.

Da ineficácia da paróquia e outros contos

No primeiro sábado de setembro teve lugar uma reunião em Compostela na que se procurou compreender as consequências que implica o “Anteproyecto de Ley de Racionalización y Sostenibilidad de la Administración Local” para o futuro reconhecimento da personalidade jurídica da paróquia, previsto no Estatuto, e para a continuidade das fórmulas de democracia direta em concelho aberto, contempladas no Lei de Bases da Administração Local e que o projeto de “racionalización” irá eliminar.

Um 15M rural

O chamado 15M foi (e continua sendo) um movimento fundamentalmente urbano que catalisou o descontento em relação a certos aspectos do sistema político e económico vigorante no Estado espanhol. Mesmo que o assemblearismo formal foi muito destacado durante o desenvolvimento do movimento, o grau de compromisso com uma autêntica transformação política foi bem diverso, existindo um abismo, por vezes ocultado com vagas palavras de ordem, entre o reformismo institucional promovido por grupos como “Democracia Real Ya” e as mais sinceras expressões populares de rejeição da classe política profissional (sobre estas diferenças, vejam-se obras como “Pensar el 15M y otros textos”).

Quando a paróquia morre de morte matada

A hipótese do reconhecimento da personalidade jurídica da paróquia galega será aniquilada em poucos meses polo governo de Madrid. A denominada “Ley de Racionalización y Sostenibilidad de la Administración Local” dissolve as entidades de âmbito territorial inferior ao município e impossibilita a sua constituição futura suprimindo a possibilidade de aplicar o regime de concelho aberto em democracia direta. A Lei deixará sem eficácia o Art.º 40 do Estatuto de 1981 e implicará o fim das nove entidades locais menores existentes na Galiza: Arcos da Condesa, Bembrive, Berã, Camposancos, Chenlo, Morgadães, Paços de Reis, Queimadelos e Vila-Sobroso.