A história de NÓS-UP em meia dúzia de contributos para a construçom nacional

Há poucos dias que NÓS-Unidade Popular anunciou a sua dissoluçom, 14 anos depois da Assembleia Fundacional, em junho de 2001.

Por Maurício Castro | Ferrol | 01/07/2015

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Sabemos bem que o estudo dos factos individuais ou coletivos de qualquer experiência histórica deve ser feita com a suficiente distáncia. Como participante no processo que resultou na criaçom da organizaçom e integrante da mesma até o seu último dia de vida, nom me corresponderia a mim abordar essa tarefa. 
 
Mesmo assim, quero fazer a minha particular homenagem urgente às galegas e galegos que passárom por essa organizaçom em todos estes anos, dando em nom poucos casos o melhor delas para o avanço do que juntas defendemos com total sinceridade e entrega. Algumhas dessas companheiras e companheiros inclusive já nom estám entre nós, como a luguesa Helena Talho, o salvaterrense Manolo Soto ou o fenês Martinho. A mais especial lembrança é para elas neste momento.
 
Nom encontro melhor maneira de deixar testemunho dessa homenagem urgente que apresentar umha pequena, mas significativa, mostra de contributos que NÓS-UP deixou ou contribuiu para deixar na história da nossa sempre inacabada construçom coletiva como povo.
 
1. Definiçom territorial. Desde o início, a nossa organizaçom fijo questom de afirmar os traços físicos da Naçom Galega. Essa tinha sido umha das várias indefiniçons ou inconseqüências do nacionalismo galego ao longo da história, tendo adotado em muitos casos acriticamente o mapa quadriprovincial com que Espanha nos define desde o século XIX. A elaboraçom de umha proposta territorial de base comarcal e dimensom extra-autonómica provocou, a partir do ano 2003 umha importante polémica, incluindo as condenas institucionais e mediáticas do espanholismo. Entretanto, coletivos e pessoas galegas assumírom esse mapa como referência provisória para umha imprescindível afirmaçom territorial dos marcos da Naçom. Com os seus defeitos e limitaçons, a proposta foi feita.
 
2. Atualizaçom do diagnóstico lingüístico. Quando nasceu NÓS-UP, o nacionalismo galego ainda arrastava o ingénuo discurso normalizador das décadas precedentes, baseado no caráter “eternamente maioritário” do galego, que só precisava de um governo nacionalista para impor a sua hegemonia. Pola nossa parte, desde logo advertimos sobre a tendência acelerada para a perda de falantes, que obrigava a atualizar o diagnóstico e a adotar medidas diferentes da simples galeguizaçom administrativa das instituiçons. O tempo confirmou e estendeu o discurso independentista neste ponto, mas a falta de consciência lingüística continua a impedir a recuperaçom do galego, mais ameaçado do que nunca antes na história.
 
3. O reintegracionismo nas ruas. Contra vento e maré, NÓS-Unidade Popular utilizou sempre e em todos os contextos o padrom galego proposto pola AGAL. As suas campanhas nom só socializárom a nossa ortografia, como também introduzírom vocabulário “inédito” a norte do Minho, ligado à prática política: as “greves”, as “faixas” e os “cartazes” saírom dos gabinetes e dos “congressos lusistas” para as ruas e centros de trabalho e de ensino. Passando por cima dos preconceitos de alguns consagrados inteletuais e escritores isolacionistas, operários e operárias galegas com nomes e apelidos adotárom a coerente prática reintegracionista. Dúzias das filiadas e filiados de NÓS-UP galeguizamos de maneira legal, efetiva e definitiva, com critério ortográfico reintegracionista, os nossos nomes a apelidos nos nossos respetivos registos civis, nos bilhetes de identidade e nos cartons de saúde. Eu orgulho-me de ser um deles!
 
4. Supressom efetiva da símbologia franquista. Durante vários anos, NÓS-UP dedicou-se à limpeza direta de centenas e centenas de placas, escudos e estátuas franquistas de edifícios e espaços públicos da Galiza. Governos de diferentes cores em concelhos, deputaçons e na Junta multárom, detivérom e levárom os nossos companheiros e companheiras a julgamento por pintarem de cor de rosa as “cruzes dos caídos”, ou por decapitarem e derrubarem estátuas de Franco e por retirar todo o tipo de vestígio franquista um pouco por todo o País. O trabalho nom foi concluído, mas serviu para sensibilizar sobre o assunto e retirar umha parte significativa desses símbolos do fascismo, antes e depois da aprovaçom da deficitária Lei da Memória Histórica.
 
5. O antipatriarcado como eixo programático. Hoje talvez poucas pessoas lembrem, mas foi NÓS-Unidade Popular a primeira organizaçom política mista que incorporou, a inícios do século atual, o eixo antipatriarcal à mesma altura que o independentismo e o socialismo em toda a sua atividade política. Sofrendo nom poucas “brincadeiras” e incompreensons doutras correntes políticas, a posiçom de coerência de NÓS-UP nesse ponto foi mais tarde assumida por praticamente todas as organizaçons da esquerda nacional galega.
 
6. Socializaçom do independentismo. Deixo para o final o que poderá ser o contributo mais significativo. É claro que, antes de NÓS-Unidade Popular, outras organizaçons já estendêrom a reivindicaçom independentista. Porém, talvez tenha sido NÓS-UP a que mais intensa e extensamente o tenha feito no século atual. Apesar do seu caráter minoritário, mesmo sem dimensom institucional, NÓS-UP e a corrente política em que se inscreveu nestes anos contribuiu para  que outras organizaçons assumissem a reclamaçom explícita da República Galega. A clara reorientaçom do BNG e da sua organizaçom juvenil nos últimos anos é bem significativa de como NÓS-UP conseguiu passar esse legado nacionalitário para importantes setores da nossa esquerda nacional e especialmente da juventude.
 
Ninguém pense que quem isto escreve está a autoengar-se quanto à dimensom e transcendência social da experiência política a que alguns galegos e galegas dedicamos umha boa parte das nossas vidas entre 2001 e 2015. 
 
Toda a nossa militáncia é consciente das nossas limitaçons individuais e coletivas, mas também sabemos que tanto esforço nom foi em vao. Se a Galiza tem futuro, será, nem que seja numha pequena medida, graças a esse trabalho altruísta e de amor à Pátria que, junto a outros coletivos e compatriotas, as filiadas e filiados de NÓS-UP desenvolvemos nestes anos.
 
Nessa tarefa, cometendo muitos erros e acertando algumha vez, continuaremos a investir umha parte importante das nossas energias vitais, até algum dia nós ou os nossos filhos e filhas erguermos na história essa Pátria Galega Soberana com que tanto sonhamos.

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Mauricio Castro Maurício Castro nasceu en Ferrol en 1970. Licenciado em Filologia Galego-Portuguesa pola Universidade de Compostela, dedica-se profissionalmente à docência de Português. É autor de diferentes ensaios, sobretodo de temática lingüística e sociolingüística, como a História da Galiza em Banda Desenhada (1995), Manual de Iniciaçom à Língua Galega (1998), Galiza e a diversidade lingüística no mundo (2001), o Manual Galego de Língua e Estilo (2007) ou Galiza vencerá! (2009). Primeiro presidente da Fundaçom Artábria.