Apoio ao emérito

O 18/08/2020 mais de 70 ex-ministros e altos cargos do PP, PSOE e UCD, assinaram um manifesto de apoio ao rei emérito, defendendo a sua presunção de inocência e lembrando o seu legado nestes quarenta anos de democracia, a “etapa mais frutífera que conheceu Espanha na época contemporânea”, como se o progresso dum país dependesse duma pessoa, e, sobre todo, duma pessoa que não governa.

Por Ramón Varela | Ferrol | 01/09/2020

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Não cabe a menor dúvida de que se trata de mui altos cargos que jogaram um rol muito importante no devir político de Espanha, e muitos deles participaram nas três grandes eivas que tem a legalidade vigorante e a sociedade espanhola em geral, que são a recentralização do poder para deixar as autonomias sem capacidade real decisória sobre os temas mais relevantes, processo que se iniciou com a LOAPA, e, dado que foi declarada em grande parte inconstitucional, continuou com a politização da justiça e a míngua da divisão de poderes, do qual foi um elo importante a reforma do Poder Judicial em 1985, que fez exclamar a Alfonso Guerra: “Hoje carregamo-nos a Montesquieu”, e do que é expoente o controle da justiça por algum dos assinantes do manifesto, e o terceiro e, em grande parte, consequência dos anteriores, a corrupção a todos os níveis, iniciada na época de Felipe Gonzalez.   
 
Apesar de que o rei foi declarado inviolável na CE, polo qual não pode ser submetido a juízo, polo menos no exercício do seu cargo de Chefe do Estado, que se vem estendendo também aos seus atos privados, e também que dispõe livremente do seu orçamento sem render contas ao soberano, que teoricamente é o povo espanhol, parece que isto não é suficiente garantia para os abaixo assinantes e reclamam que se respeite a presunção de inocência, como se tivesse sido conculcada. A presunção de inocência é o direito do réu a ser considerado inocente, enquanto não se demonstre o contrário. De momento, nenhum tribunal o julgou  e incluso é duvidoso que o possa julgar algum dia, devido aos escolhos que teria que superar, e, portanto, o emérito tem este direito, e incluso muito melhor garantido que qualquer outro membro do soberano. Mas, sobretudo nos países em que a justiça está politizada, sem divisão de poderes real e efetiva, e tem pouca credibilidade social, como é o caso no Estado espanhol, a gente também acode à culpabilidade que podemos chamar histórica, ou seja, a que é produto das investigações de pessoas independentes e dotadas de credibilidade social.
 
Aliás, se o problema é a presunção de inocência, quiçá tivessem que repreender ao rei Filipe, que com a sua renúncia, nula de pleno direito, à herança, veu reconhecer que a ação do emérito que a provocou era fidedigna, e ele conhecia muito bem o percal, pois, seria um absurdo que pretendesse realizar esse gesto de cara à galeria se tivesse dúvida de que a apropriação indevida que se investiga desde Suíça não era real e efetiva. Por outra parte, creio que vários dos assinantes deveriam saber o que passava com o rei emérito praticamente desde o princípio do seu reinado e em vez de denunciá-lo para pôr-lhe couto, fizeram a vista gorda e olharam para outro lado, fazendo-lhe um fraco favor à mesma instituição. Como pretendem agora que os creiamos tanto a eles como ao seu protegido? Em realidade, esta iniciativa parece ter como objetivo proteger o monarca atual, porque eles sabem que a hipotética caída do rei emérito deveria, numa instituição hereditária, arrastrar logicamente a do seu filho. Vão ter muito trabalho para lográ-lo porque a falta de freios e de controle pessoal afeta a todos os seus atos, nada exemplares, por certo.

O rei emérito
O rei emérito | Fonte: RTVE
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Ramón Varela Ramón Varela trabalhou 7 anos na empresa privada e, a seguir, sacou as oposições de agregado e catedrático de Filosofia de Bacharelato, que lhe permitiu trabalhar no ensino durante perto de 36 anos.