Reflexons comunistas respeito ao unitarismo e fetichismo eleitoral

A campanha das autonómicas está passando sem pena nem glória. O ambiente que se vive na rua face o processo eleitoral de 21 de outubro é de umha enorme frialdade. A imensa maioria do nosso povo aborda entre a indiferença e a desconfiança as novas eleiçons a um parlamentinho carente de competências, portanto de soberania, transformado em mero apêndice das Cortes espanholas.

Por Carlos Morais | Compostela | 14/10/2012

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A perceçom geral -contrariamente à atmosfera de 2005 e, em menor medida, à de 2009-, é que o resultado aritmético, seja qual for, nom vai alterar o obscuro horizonte que Espanha e a troika pretende impor à classe trabalhadora galega. Umha parte mui destacada da nosso povo é consciente do esgotamento institucional à hora de resolver os graves problemas a que se vê submetido.  
 
Sabe que as duas alternativas em jogo –continuidade do PP ou governo bipartido/tripartido nas suas diversas modalidades-, nem querem, nem podem frear a incessante ofensiva contra os direitos e conquistas sociais, cortes em liberdades, políticas involucionistas e permanente espanholizaçom. Porque, sendo promovidas por um insaciável Capital, som implementadas pola casta política cleptocrática que procura ser ratificada legitimando o nosso voto. 
 
As maquinarias eleitorais dos partidos nom som capazes de alterar esta correta perceçom popular. Som muitos anos de promessas incumpridas, de deceçons e, basicamente, mui acelerado o processo de perda de credibilidade de um modelo que, aparentemente sólido embora insatisfatório, era aceite como mal menor. 
 
Enquanto o Estado da providência mantivo coesa boa parte da populaçom com base num insustentável modelo de “crescimento económico” fictício, o sistema assegurava estabilidade social, obtendo em troca umha maioritária adesom eleitoral às forças políticas que aparentando pluralismo só defendiam os interesses da oligarquia, perpetuando assim a exploraçom. 
 
Salvo esporádicos protestos e reduzidos e pontuais ciclos de luita, a pax social caraterizou as três últimas décadas da democracia burguesa espanhola imposta à Galiza. 
 
Levamos mais de um lustro padecendo os efeitos da “crise” e, sobretodo, carecemos de data crível para a resolver, pois já ninguém lembra os disparates dos rebentos verdes de Zapatero. Ambos fatores tenhem desgastado a credibilidade do sistema no ámbito da representaçom. 
 
Existe umha progressiva desafetaçom face à casta política corrupta. Porém, a crise de legitimidade ainda nom adota a forma de questionamento radical do modelo de democracia burguesa e em muita menor medida da economia de mercado na qual se apoia. 
 
Estéreis alternativas 
 
As falsas alternativas que o próprio regime alentou o ano passado a partir da madrilena Porta do Sol fôrom úteis para atrasar a maduraçom de um questionamento integral da ditadura burguesa. Contribuírom para gerar adulteradas e inofensivas esperanças de poder melhorar os mecanismos de controlo e participaçom popular da democracia burguesa como fórmula adequada para mudar as políticas económicas. A ingenuidade e inexperiência de boa parte dos ativistas, unido à desconfiança e carência de umha alternativa revolucionária ao capitalismo, provocou o reforçamento das arreigadas superstiçons reformistas, baseadas em medidas corretoras, em maquilhagens parciais das causas da crise, como a supressom das práticas usurárias dos banqueiros ou a reduçom dos obscenos salários da casta política.
 
A revolta espontánea, dirigida por setores da pequena burguesia empobrecidos e desconcertados por um situaçom imprevista, agírom como a perfeita válvula de escape que possibilitou ao sistema ganhar tempo e gerar confusom. A importante capacidade de arraste de amplos e bem intencionados setores populares complementou o êxito da operaçom.
 
Mas o 15-M passou e, perante a agudizaçom dos efeitos das políticas de “ajustamento” impostas, a calma e a serenidade, o “civismo” que os meios elogiavam, pode começar a dissipar-se. Daí a mudança de atitude por parte da indústria mediática ao serviço do aparelho de reproduçom ideológica capitalista a respeito do movimento de massas que semelha configurar-se em escala estatal. Estamos, pois, perante a contraditória configuraçom de um novo cenário.
 
Porém, este novo sujeito multiforme que desestabiliza os planos do governo de Mariano Rajói -onde confluem as reivindicaçons independentistas da Catalunha, o ascenso da luita de classes, os protestos pós-15-M, as mobilizaçons do sindicalismo hipotecado com o regime-, possuem um similar fio condutor: o legalismo instititucional e o unitarismo dimitroviano. 
 
Se nom se alterar a correlaçom de forças no campo popular -o que nom semelha previsível de imediato-, novamente nom haverá a curto prazo possibilidades de levantar umha trincheira na qual vertebrar a resistência e desenhar a contraofensiva operária.
 
Sem lugar as dúvidas, é a fraqueza e dispersom da esquerda revolucionária um factor determinante à hora de compreendermos as enormes limitaçons da luita de massas numha conjuntura objetivamente favorável. Novamente, a debilidade do elemento subjetivo, da consciência organizada da classe obreira no partido comunista e no movimento popular que este promove e articula, impossibilita avançar na direçom da rebeliom.
 
Etapa de ouro do oportunismo na Galiza ou simples miragem?
A crise económica golpeia com mais profundidade e contundência no nosso país e nas suas maiorias sociais, polo histórico atraso económico e consolidada dependência nacional a que a Galiza se vê submetida por Espanha. As estatísticas socioeconómicas comparativas com a média estatal som demolidoras em todos os ámbitos.
 
No entanto, para entendermos as causas do baixo nível de conflituosidade e mobilizaçom da nossa formaçom social, devemos dirigir a nossa olhada às caraterísticas da esquerda nacional e à ideologia que em boa medida impregna o seu conjunto. O unitarismo inoculado no movimento obreiro no 7º Congresso da Internacional Comunista (1935), e as suas posteriores interpretaçons e deformaçons ainda mais oportunistas, adaptadas à luita de libertaçom nacional, formam parte do ADN da esquerda espanholista, mas também da de ámbito nacional. 
 
Para os defensores desta estratégia condenada de antemao ao fracasso, semelha absurdo e mesmo delirante ter que mergulhar tam atrás para achar umha explicaçom teórica do que está a acontecer. Porém, a luita de classes é um processo histórico global, nom é fruto de conjunturas imediatistas e parciais.
 
Na genética da prática totalidade do movimento popular galego, a procura da unidade em sentido restritivo, entendida como a renúncia ao programa obreiro, além de alinhar as reivindicaçons populares polo nível mais assumível para os setores intermédios, permite explicar os modelos da UPG-BNG, de PCE-IU e, mais recentemente, da Anova.
 
Este unitarismo de amplo espectro, de caráter popular e democrático, dota-se de modelos organizativos aparentemente pluralistas, de “sensatos” programas políticos interclassistas, de táticas e estratégias subordinadas ao parlamentarismo burguês, onde a existência de um inimigo principal subordina-o todo. O endurecimento ou abrandamento do discurso estará modulado pola conjuntura política. 
 
A ausência da alternativa revolucionária da esquerda independentista e socialista nesta campanha eleitoral -expressom evidente da sua fraqueza nesta frente de luita-, contribui para ressaltar as limitaçons estruturais de todas as alternativas que, sob a etiqueta de esquerda, pretendem a toda custa agregar apoios eleitorais agitando o fantasma do PP e lavando a cara ao PSOE.
 
Mas este modelo impossibilita a acumulaçom de forças face a revoluçom socialista, atando e hipotecando o movimento popular ao eleitoralismo no seu conjunto, esvaziando-o do seu antagonismo. 
 
Vejamos pois como se concreta na atualidade.
 
Depois de ter marcado nos últimos seis meses duas datas de greve geral, a CIG deu marcha atrás. Na primeira ocasiom, sem explicar motivos e, mais recentemente, pola necessidade de contar com o aval do sindicalismo institucional espanhol, depois de imprimir um novo giro copernicano na política de alianças com CCOO e UGT. 
 
As recentes mobilizaçons de 4 de outubro, convocadas para quatro horas antes do início da campanha eleitoral, som o paradigma do indecente submetimento da luita de classes à dinámica do parlamentarismo burguês e da existência de um suposto inimigo principal, absolvendo assim a outra expressom política do regime. 
 
A culpa de quem é, a culpa é do PP é a errónea palavra de ordem que impossibilita quebrar o imaginário burguês da alternáncia política entre setores avançados das massas.
Sem lugar a dúvidas, a prática do unitarismo e do fetichismo eleitoral hipotecam a estratégia da central, gerando perplexidade e desconfiança entre a classe trabalhadora.
 
A recém criada coligaçom eleitoral entre um setor de cindidos do BNG -previamente confluídos com a FPG e outros grupos em Anova-, com IU e outros grupos políticos pequeno-burgueses, mais virtuais que reais, semelha ser a novidade deste processo eleitoral, gerando expetativas em setores populares desencantados com os partidos tradicionais. Mas, além da retórica empregada, do carisma de Beiras, e da fascinaçom que gera o unitarismo, nem o programa político, nem a tática e a estratégia desta opçom achegam nada novo ao panorama da esquerda institucional da Galiza. Nom passa de umha nova e maquilhada formulaçom recauchutada e empiricamente constatada como experiências erróneas e nefastas para a luita.
 
No entanto, introduz de facto umha involuçom a respeito do que defende o BNG, porquanto renuncia ao princípio de auto-organizaçom, facilitando a reincorporaçom da social-democracia espanhola ao parlamentinho do Hórreo.
 
A veloz operaçom que fraguou a aliança electoral constitui um exemplo quase perfeito do oportunismo -entendido como esse cancro que justifica ceder nos princípios para avançar mais rápido, de eleger entre o mal menor, ao qual Lenine tantos recursos investiu em denunciar. Além disso, é umha das opçons de recâmbio que o sistema necessita para injetar credibilidade nos processos eleitorais e na ilusom parlamentar perante a cada vez maior desafetaçom de umha parte do povo com a política.
 
Realmente acertou em parte quem definiu de Syriza galega a coaligaçom Anova-IU, pois som mui elevadas as similitudes com a força política grega configurada por pós-marxistas, náufragos do PASOK e umha caldeirada de grupos com trajetórias e matrizes diversas, todos inofensivos para a hegemonia do Capital. 
 
Ambas som atrativos projetos unitários social-democratas, disfarçados de radicalismo pequeno-burguês, carentes de um programa coerentemente patriótico e anti-imperialista. 
 
A convivência no seu interior de um independentismo sem princípios, com umha falsa esquerda soberanista e anticapitalista e a descomplexada cultura espanhola de IU, pode agir de afrodisíaco eleitoral, mas carece de capacidade real para vertebrar um movimento popular dotado de um programa patriótico e de esquerda.
 
Porque vai ser mais creível, além da pura ilusom, fé e supestiçom, a aliança entre o Beiras que se reúne há uns dias com o Clube Financeiro de Vigo, e a sucursal autonómica de Cayo Lara, que a timorata alternativa reformista e pactista de Jorquera e Aymerich? 
 
O capitalismo espanhol está satisfeito, assim o manifestou ontem um dos seus vozeiros, porque a Galiza nom tenha também caído no desvario independentista.
 
Nada que escolher 21 de outubro
 
Porque a alternativa nom está em escolher entre o autoritarismo do PP e a restauraçom das formas e estilos aggiornados da democracia liberal que recupere a confiança das massas na política parlamentar. A disjuntiva hoje situa-se entre reforçar o caos capitalista ou vertebrar o bloco histórico para a revoluçom socialista galega.
 
Bloque, Anova-IU, por nom citar PSOE, PP, CxG e resto de projetos burgueses, com os matizes que quigermos agregar, fam parte da primeira opçom. Eis porque nom apoiamos nengumha das forças que se apresentam.
 
Um substancial incremento da abstençom e do voto nulo pode contribuir para construir umha nova atmosfera política e social que facilite o desenvolvimento da alternativa revolucionária que o nosso povo necessita, pode ajudar a libertar a enorme capacidade de luita que possui a classe obreira. 
 
Constringi-la ou libertá-la dependerá de seguir atando-a ao fetichismo do falso unitarismo de siglas e interesses de classe divergentes, ou favorecer a ruptura com a lógica da ditadura parlamentar e o ilusionismo de poder regenerar um sistema senil em irreversível declínio.
 
Há que construir umha alternativa obreira, feminista e patriótica com o centro de gravidade na rua, nas luitas de massas, que se forje no combate. Umha força política e movimento social que demarque os campos do proletariado e setores populares com os da pequena-burguesia, umha força e movimento popular construído sobre o princípios da independência política e da auto-organizaçom nacional, que procure a hegemonia para a tomada do poder.
 
Umha força política e movimento social que apele e promova a rebeliom popular, que sem renunciar à complementaçom de todas as formas de luita que historicamente tenhem empregado as oprimidas e explorados, saiba dialeticamente incidir na utilizaçom da mais adequada a cada fase do processo face a insurreiçom nacional, obreira e popular.
 
Nom podemos olhar para outro lado frente aos ventos de repressom e guerra que prepara o Estado. Nom há pior cego que aquele que nom quer ver. O capitalismo vai empregar toda a força bruta de que dispom para perpetuar a ditadura burguesa. Nom vai ceder pacificamente nada. Nom vai permitir o exercício da autodeterminaçom nacional, nem umha alteraçom da sua desordem social, em funçom de maiorias eleitorais nem negociaçons. Todo o que temos ganho foi luitando. Que motivos nos podem levar a pensar que no futuro vai ser diferente? 

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Carlos Morais Carlos Morais nasceu em Mugueimes, Moinhos, na Baixa Límia, a 12 de maio de 1966. Licenciado e com estudos de doutoramento em Arte, Geografia e História pola Universidade de Compostela, tem publicado diversos trabalhos e ensaios de história, entre os quais destacamos A luita dos pisos, Ediciós do Castro, 1996; Crónica de Fonseca, Laiovento, 1996, assim como dúzias de artigos no Abrente, A Peneira, A Nosa Terra, Voz Própria, Política Operária, Insurreiçom, Tintimám, e em publicaçons digitais como Diário Liberdade, Galicia Confidencial, Sermos Galiza, Praza Pública, Odiário.info, Resistir.info, La Haine, Rebelion, Kaosenlared, Boltxe ou a Rosa Blindada, da que fai parte do Conselho assesor. Também tem publicado ensaios políticos em diversos livros coletivos: Para umha Galiza independente, Abrente Editora 2000; De Cabul a Bagdad. A guerra infinita, Dinossauro, 2003; 10 anos de imprensa comunista galega, Abrente Editora 2005; A Galiza do século XXI. Ensaios para a Revoluçom Galega, Abrente Editora 2007; Galiza em tinta vermelha, Abrente Editora 2008; Disparos vermelhos, Abrente Editora 2012. Foi secretário-geral de Primeira Linha entre dezembro de 1998 e novembro de 2014. É membro do Comité Executivo da Presidência Coletiva do Movimento Continental Bolivariano (MCB). Fundador de NÓS-Unidade Popular em junho de 2001, formou parte da sua direçom até a dissoluçom em maio de 2015. Na atualidade, fai parte da Direçom Nacional de Agora Galiza e do Comité Central de Primeira Linha.